Cotidiano

CONGEMAS se posiciona quanto às alterações no programa Bolsa Família e reafirma as demandas dos municípios por trabalho, emprego, renda e proteção social!

O Colegiado Nacional de Gestores Municipais de Assistência Social – Congemas tomou conhecimento, por meio da mídia, das possíveis alterações no Programa Bolsa Família, anunciadas pelo governo federal sem qualquer diálogo com gestores municipais, em total desconsideração do papel central dos municípios, que empreendem recursos humanos e financeiros no programa, além da experiência acumulada e das corresponsabilidades dos entes federados.

O benefício socioassistencial, inclusive com o bônus, deve ter um prazo para ser encerrado após a carteira de trabalho ser assinada. Não há informações quanto ao período e o valor adicional. Basicamente o que o governo tem anunciado é: ampliação do público atendido, do valor do benefício e criação de um bônus por desempenho escolar e esportivo; aumento no valor no benefício que não alcança R$ 600; previsão de aumento no atendimento das famílias de 14 milhões para 17 milhões de famílias; bônus pela contratação, sem mecanismo de retorno imediato nos casos de desemprego; alteração no nome do programa de Bolsa Família para Auxílio Brasil.

O governo estuda um bônus financeiro condicionado à inserção do trabalhador no mercado formal, o que confirma a prevalência de uma visão ultrapassada sobre o papel de um programa de transferência de renda, especialmente num contexto de grave crise social, de emergência em decorrência da pandemia de covid-19, de aumento da pobreza e das desproteções sociais. Denota uma visão preconceituosa e culpabilizadora dos usuários desta política, como se fosse uma questão de vontade individual conseguir ou não uma ocupação.

Reafirmamos que não é o programa Bolsa Família o responsável pela redução de postos de trabalho. A crise econômica e social vivenciada pela população brasileira, agravada pelas contrarreformas como a trabalhista e a previdenciária, possui relação com as políticas adotadas em âmbito federal, com efeitos que agravam, ainda mais, a situação social. O que se coloca como desafio urgente, é a definição de políticas que efetivamente gerem oportunidades de trabalho, emprego e renda.

O que o governo federal desconsidera é que a realidade de mercado formal não é homogênea e muito menos uma questão de esforço individual. O programa já possui focalização na população mais vulnerável e deveria ser ampliado quanto sua cobertura e valores, especialmente diante da crise social.

A complementação de renda por meio do bolsa família visa inclusive mitigar a situação de desemprego e a precarização das condições de vida, fatores que estão sendo agravados pelos efeitos sociais das reformas adotadas, como a vigência de contratos intermitentes que fragilizam vínculos de trabalho. Estamos vivenciando um contexto de aumento do desemprego e do trabalho informal, o que por si só justifica a necessidade de ampliação do programa bolsa família, quanto à cobertura, para além das mudanças nos critérios que tendem, diante do marco fiscal imposto pela Emenda Constitucional nº 95/16, que congelou os recursos para as políticas sociais por 20 anos, e da ausência de iniciativas para a ampliação dos recursos para a assistência social em relação às demandas que só ampliam.

A realidade pandêmica no Brasil fez com que 13% dos trabalhadores ocupados no 1º trimestre de 2020 estivessem sem ocupação no segundo trimestre, sendo que a perda de ocupação foi mais intensa entre trabalhadores mais fragilizados. Entre os que recebiam até 1 salário mínimo, 23% estavam sem ocupação no 2º trimestre e 31% dos trabalhadores domésticos perderam sua ocupação. Quase ¼ (23%) dos empregados no setor privado sem carteira assinada perderam a ocupação. Negros perderam a ocupação em proporções superiores aos brancos, 15% versus 10%. As mulheres também foram mais afetadas, já que 15% perderam sua ocupação versus 11% dos homens antes ocupados entre o primeiro e o segundo trimestre de 2020 (DIEESE, 2020b)1.

A taxa de desocupação engloba a taxa de desemprego, a desocupação de autônomos e trabalhadores por conta própria. Além do desemprego, há sinais de aumento da precarização com crescimento no número de trabalhadores por conta própria, passando de 21,1 milhões para 24,2 milhões, 80% dos quais sem CLT, proteção trabalhista ou contribuição previdenciária no segundo trimestre de 2020 (DIEESE, 2020a).

Os jovens e as pessoas mais velhas perderam proporcionalmente mais posições que as outras faixas etárias, entre os de 14 a 17 anos ocupados. Destacamos que 31% perderam ocupação, 18% entre os de 18 a 24 anos e 22% entre os que possuem 70 anos ou mais. Os que possuem baixa escolaridade também foram mais afetados, pois 22% dos ocupados, sem instrução e com menos de um ano de estudo, estavam sem trabalhar no 2º semestre. Entre os que possuem ensino fundamental incompleto, essa taxa foi de 18%, e entre os com ensino superior completo, somente 6% perderam ocupação no período (DIEESE, 2020b)2.

Os impactos da pandemia no mercado de trabalho são diversos. Em setembro de 2020, 2,7 milhões de pessoas estavam afastadas do seu trabalho devido ao distanciamento social; 7,9 milhões estavam trabalhando remotamente e 15,3 milhões não estavam procurando trabalho por conta da pandemia ou da falta de trabalho na localidade onde vivem, são os chamados trabalhadores desalentados, que desistem de procurar emprego por um período de tempo pela falta de perspectivas de encontrar algo. Esse grupo representa 8,8% dos 174,6 milhões de brasileiros com 14 anos ou mais que estão na chamada população em idade ativa para o trabalho. Para figurar nas estatísticas de desemprego, não basta a pessoa estar desocupada, é preciso que ela esteja desocupada e tenha procurado emprego em um período determinado anterior à pesquisa. Pessoas desocupadas, que tem desejo de ter uma ocupação, mas que não procuraram emprego recentemente ou desistiram de procurar por algum motivo não entram nas estatísticas de desemprego. Esse segmento, chamado de desalentado, possui demandas e características diferentes do segmento desempregado e deve ser alcançado pelas políticas públicas específicas. Além do desemprego e desalento, em novembro, 16,3 milhões de pessoas ocupadas tiveram rendimentos efetivos do trabalho menores que normalmente recebem por causa da pandemia e suas consequências, evidenciando a fragilização do emprego e renda não somente de quem perdeu a ocupação, mas também de parte de quem a manteve (IBGE, 2021)3.

As crises econômicas vivenciadas, sejam as surgidas por crises internas aos sistemas econômicos ou choques externos com reflexos internos, tais como a pandemia atual, possuem repercussões diferenciadas em sociedade, que condiciona o aumento abrupto da pobreza e da pobreza extrema.

No contexto de pandemia e de grave crise social, o Congemas vem intensificando a incidência política por mais proteção social à população brasileira. Na conjuntura de duras restrições financeiras e de ampliação das demandas por políticas socais, o que se defende é a ampliação e o aprimoramento do Programa Bolsa Família, no que se refere à abrangência do público atendido e a ampliação dos valores, mantendo-se os patamares do Auxílio Emergencial e os instrumentos implementados no âmbito do SUAS, notadamente o CadÚnico e o conjunto dos serviços e benefícios socioassistenciais.

Outro aspecto que vem preocupando gestores da assistência social é a fila de espera para acesso ao Bolsa Família. Ao somarmos as famílias beneficiárias do Bolsa Família e a fila de espera, o patamar especado é de aproximadamente 16,8 milhões de famílias. São aproximadamente 2.164.557 milhões de famílias aguardando o benefício (SAGI, MC, 2021).

A instituição do Auxílio Emergencial em abril de 2020 conseguiu reverter parte dos efeitos negativos esperados da pandemia, ao menos no segundo trimestre de 2020, quando a taxa de pobreza extrema caiu pela metade, totalizando 3,3%. Já a taxa estimada para 2021 com a instituição do novo AE de valor reduzido era de 9,1%, 40% superior à de 2019 e quase três vezes a taxa em 2020 quando o auxílio emergencial em sua primeira fase estava em vigor. 13,1 milhões de pessoas saíram da pobreza – renda per capita inferior a meio salário mínimo – devido ao auxílio e outros programas, a proporção de pobres passou de 31% em 2019 para 24,6% em julho de 2020.

Reforçamos que metade dos brasileiros, ou seja, quase 105 milhões de pessoas, sobrevive com menos de R $438 reais mensais, menos de R $15 reais por dia para cobrir suas necessidades básicas (DIEESE, 2020a)4. Assim, ampliar a proteção da população mais vulnerável e implementar políticas de trabalho decente é o que se espera dos governos. No entanto, outras medidas preocupantes estão sendo anunciadas ou decididas, dentre elas o Serviço Social Voluntário, que preconiza a contratação de jovens de 16 a 29 anos ou trabalhadores com mais de 50 anos, sem a proteção ao trabalho e de forma precarizada, e a Medida Provisória nº 1045/21, que ao instituir o Novo Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda, estabelece, uma modalidade de trabalho altamente precarizada.

A população mais pobre e que vive em contextos mais desiguais no Brasil, tem sofrido as consequências da adoção de políticas que reduzem serviços e benefícios sociais, em evidente subordinação dos direitos sociais às medidas de ajuste fiscal. As propostas e as medidas do governo federal e do legislativo não têm sido suficientes para atender às demandas sociais nos municípios.

Além dos efeitos perversos da Emenda Constitucional nº 95/16, que congelou por 20 anos os recursos para as políticas sociais, as alterações do Cadastro Único para programas sociais que representarão, caso sejam implementadas, maior exclusão no acesso, já que a principal alteração é o cadastramento via aplicativo pelo próprio cidadão, as mudanças no Bolsa Família sem diálogo, apenas expressam uma decisão que vai “repaginar” o programa e implementar uma falsa expectativa de maior inclusão social.

Reafirmamos ser imprescindível que o governo federal: estabeleça o diálogo com os gestores para os devidos aprimoramentos no programa bolsa família e no CadÚnico, sem prejuízos para a população quanto ao acesso; ampliação do bolsa família nos patamares do Auxílio Emergencial, com revisão de valores e cobertura; garantia dos recursos necessários para as ações e serviços socioassistenciais, partindo-se dos valores aprovados pelo Conselho Nacional de Assistência Social; garantia de orçamento e cobertura de serviços integrados aos benefícios em respostas às demandas decorrentes da pandemia; retomada e ampliação do financiamento dos programas Ações Estratégicas de Enfrentamento do Trabalho Infantil – AEPETI e do Programa de Promoção do Acesso ao Mundo do Trabalho – ACESSUAS Trabalho; adoção de políticas de ampliação do trabalho, emprego e renda, de trabalho decente, visando enfrentar os efeitos socais da economia.

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