Esportes

‘Censura’ inibe comemorações irreverentes e provocações ‘sadias’

VINICIUS JUNIOR FLAMENGONa década de 1970, o artilheiro Dario anuncia que vai fazer dois gols pelo Atlético Mineiro contra o Corinthians. Nos anos 1980, Chicão aposta que corta o bigode se o Santos perder o jogo para o São Paulo, de Serginho Chulapa. O Botafogo é campeão brasileiro com o atacante Túlio apelidando cada um de seus gols. Todos esses lances marcaram época no futebol, promoveram grandes jogos e motivaram os torcedores a lotar os estádios pelo Brasil.

 

Mas, hoje, estão proibidos no dia a dia do esporte mais popular do mundo. “Uma característica da sociedade contemporânea é a total liberdade de opinião. Vivemos em um imenso Big Brother, onde uma pessoa que jamais leu a Constituição se acha no direito de discutir com um juiz, que há 50 anos trabalha no STF. Temos de saber conviver com isso”, disse o historiador Leandro Karnal.

Serginho Chulapa, maior artilheiro da história do São Paulo (242 gols), considera uma “frescura” quando torcedores e críticos opinam contra, por exemplo, na atitude do flamenguista Vinicius Júnior (foto), que imitou o chororô ao fazer um gol contra o rival Botafogo, pela Taça Guanabara – ou na comemoração de Vinicius, do Bahia, que desencadeou um conflito entre jogadores no clássico entre o seu clube e o Vitória, pelo Campeonato Baiano.

“É por isso que o futebol ‘tá’ chato. Qualquer coisa é motivo para reclamar. É esse tipo de coisa que chama o torcedor para ir ao jogo”, afirmou o atacante, que também atuou pelo Santos e Corinthians. “Eu não daria a mínima para as redes sociais. Faria tudo de novo. E iria também em boates depois dos jogos”, disse o ex-jogador, que teve a carreira marcada pela irreverência.

Leandro Karnal destaca o importante papel das redes sociais para a relação social problemática atualmente. “Essa relação sempre foi complicada, mas agora está pior. É a vingança do recalcado. Não basta ter uma opinião. É preciso que o outro tenha a mesma opinião que você. Os psicanalistas dizem que o narcisismo está enfraquecido, pois não se contenta apenas em ser o correto. É preciso que os outros também o considerem correto”.

Dario, o Dadá Maravilha, autor de 926 gols por mais de duas dezenas de clubes, gostava de se autopromover antes dos jogos. Dava apelido para os gols e anunciava quantos iria fazer uma partida. “Fui o inventor do marketing no futebol. Sabia me comunicar com o povo. As pessoas me respeitavam, pois sempre respeitei meus adversários”, disse o artilheiro dos Campeonatos Brasileiros de 1971, 1972 e 1976.

Segundo Dario, os torcedores adversários na sua época também “chiavam”. “Se eles reclamavam de mim, eu dizia para eles que iria parar de fazer gol. Aí eles iriam no estádio fazer o quê? Os rivais ficavam mais bravos com os zagueiros dos seus clubes, que sempre levavam meus gols”, diverte-se o campeão mundial com a seleção na Copa do Mundo de 1970. “Me chamavam de perna de pau. Eu era perna de pau, mas fazia muitos gols. Então, ganhava a confiança do povo”.

O meia Lucas Lima teve problemas nas redes sociais. Quando atuava pelo Santos, fez comentários sobre as várias decisões que teve diante do Palmeiras, seu time atual, e acabou sofrendo fortes críticas. “Hoje em dia as pessoas não têm noção para diferenciar provocação e rivalidade”, afirmou.

Por isso, estádios lotados, com duas torcidas, comemorações divertidas e provocações ficaram no passado. O momento atual é o do futebol frio, com a cara fechada, cada vez mais longe do coração dos torcedores.

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